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IBDFAM contesta decisão do CNJ que arquivou proposta sobre reconhecimento presumido de paternidade

O Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM ingressou com um recurso administrativo junto ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ para contestar a decisão da Corregedoria Nacional de Justiça que arquivou o pedido de providências sobre mudanças no reconhecimento de paternidade no Brasil.
O recurso pede que o CNJ reconsidere a atualização dos artigos 496 e 499 do Provimento 149/2023 para permitir que a mãe indique o suposto pai diretamente ao cartório. Notificado, o homem poderá confirmar a paternidade ou se submeter a exame de DNA. Caso não se manifeste, o oficial de registro pode incluir o nome do pai no assento de nascimento, com base na presunção de paternidade pelo silêncio, assegurando-lhe o direito posterior de contestar na Justiça.
A proposta segue o modelo proposto no Projeto de Lei 4/2025, que trata da reforma do Código Civil, protocolado no Senado Federal em fevereiro passado, com base no anteprojeto elaborado por uma Comissão de Juristas, incluindo membros do IBDFAM.
Identidade negada
No recurso administrativo, o Instituto apresenta dados da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais – ARPEN e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, segundo os quais, entre 2016 e 2024, mais de 1,2 milhão de crianças foram registradas apenas com o nome da mãe. Em 2023, esse número chegou a 172,2 mil. Para o IBDFAM, esses dados refletem o machismo estrutural e uma cultura jurídica que tende a descredibilizar a palavra da mulher.
O documento destaca precedentes do Supremo Tribunal Federal – STF que reconhecem a legitimidade do CNJ para inovar na ordem jurídica por meio de resoluções, inclusive com impacto direto na cidadania, como a Resolução 175/2013, que garantiu o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
A petição ressalta que esperar a tramitação da reforma do Código Civil para garantir o direito à identidade de crianças sem paternidade reconhecida é uma afronta ao princípio da proteção integral e ao melhor interesse de crianças e adolescentes, previstos na Constituição Federal.
Regulação
Na avaliação da vice-presidente do IBDFAM, Maria Berenice Dias, a legislação atualmente em vigor encontra-se defasada, e o recurso interposto pelo Instituto tem por objetivo suscitar a apreciação da matéria pelo Plenário do CNJ, uma vez que o arquivamento do pedido pela Corregedoria fundamentou-se na alegação de que não caberia ao Conselho regulamentar temas já disciplinados em lei.
"O próprio CNJ, com base na Emenda Constitucional – EC 45/2004, tem legitimidade para editar normas de interpretação da legislação", destaca. "Tanto é assim que o artigo 610 do Código de Processo Civil – CPC determina que inventários com testamento ou herdeiros incapazes devem ser judiciais, mas o CNJ autorizou sua realização por via extrajudicial."
Segundo ela, o fundamento legal que rege o reconhecimento da paternidade é de 1962 – época em que sequer existia o exame de DNA e ainda não havia o movimento de desjudicialização. "Hoje, o oficial de registro civil pode, por exemplo, registrar a multiparentalidade baseada na socioafetividade, assumindo a responsabilidade de verificar a veracidade da situação", afirma.
"Não podemos fazer com que crianças, que gozam de prioridade absoluta, tenham que esperar por uma reforma que pode levar anos – ou sequer ser aprovada – para que se cumpra a obrigação parental, especialmente diante da legislação já existente sobre paternidade responsável e o papel do pai presente", conclui Maria Berenice Dias.
Por Guilherme Gomes
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